quarta-feira, 30 de julho de 2014

FICA, DILMA!


        

                                                                 Reinaldo Lobo*

 

     Todos sabemos no mundo moderno que há uma influência dos nossos desejos sobre as nossas crenças. Isso é do conhecimento geral. A natureza dessa influência é, porém, muito mal interpretada. O costume é supor que o conjunto das nossas crenças provém de alguma base racional e dos fatos. O desejo seria apenas uma força perturbadora ocasional. Algo que só atrapalharia a lógica do senso comum. É justamente o contrário que mais se aproxima da verdade.

      A grande maioria das crenças pelas quais somos apoiados em nossa vida diária é apenas projeção do desejo, corrigida num ponto ou noutro pelo duro choque dos fatos. Desde pelo menos o surgimento da psicanálise, com Freud , descobrimos que o ser humano é essencialmente sonhador. Desperta , às vezes, em algum momento por algum fator especialmente penetrante do mundo exterior, mas logo a subjetividade humana retorna à feliz sonolência do devaneio e da imaginação. Nossos sonhos à noite são, em grande parte, a expressão pictográfica de nossos desejos em busca de satisfação. O mesmo vale para nossos sonhos acordados. Podem ser incluídos nesses sonhos acordados o que chamamos de crenças.

      O ser humano deseja acreditar. A crença dá segurança e nos tira do desamparo diante da vida natural, da morte, da presença do outro, da brutalidade e das incertezas das relações sociais. Não só a psicanálise pensou sobre isso, mas também inúmeros filósofos, tanto céticos quanto gnósticos, desde a Antiguidade.

      A publicidade e a política descobriram, por sua vez, o que a psicanálise e os filósofos revelaram tão bem. Passaram a manipular os desejos humanos a fim de provocar adesão às crenças que querem promover.

     Um exemplo banal é a estratégia das agências publicitárias para criar e provocar desejos no consumidor. E induzi-lo a comprar sem que tome consciência plena do seu ato. A propaganda de sabonetes parte do conhecimento de que as mulheres desejam inconscientemente ser acariciadas na sua pele e que isso faz parte da sexualidade feminina. Então, colocam-nas nuas no quarto ou debaixo de um chuveiro passando suave e repetidamente um produto para a maciez da pele, num movimento masturbatório semelhante a uma preliminar de um ato sexual. Não vendem limpeza, mas uma crença de que aquilo é bom e gostoso.

     A propaganda de manipulação política funciona também assim. É menos delicada e sutil, propõe a salvação nacional, inventa líderes, destrói outros,  nos faz acreditar que estamos em pleno caminho para a realização dos nossos desejos mais idealizados ou, ao menos, na rota de nos livrarmos das crises sociais e econômicas, do sufoco, enfim.

      Goebbels, o marqueteiro do nazismo, ainda que não gostemos da sua figura repugnante ou de sua ideologia, foi um gênio na arte de manipular  a informação para obter crenças sólidas e até fanáticas. Assim como Hitler na ação política, ele soube captar o medo dos alemães em relação ao futuro, após a Primeira Guerra e a crise de 1929, e projetou uma imagem de uma nova sociedade  brilhante e bem sucedida, formada por uma raça de seres indestrutíveis.

        No Brasil atual, os marqueteiros políticos, os ativistas pagos das redes sociais, os políticos da oposição ao governo atual,alguns jovens extremistas de  ultra-esquerda, a imprensa comprometida com as forças conservadoras, estão fazendo exatamente o contrário do que Goebbels fazia. Procuram induzir, há muitos meses, uma crença na opinião pública que possa apagar qualquer brilho, êxito ou realização positiva dos governos Lula e Dilma. Para isso, pintam primeiro um quadro de "terra arrasada" e de catástrofe, para depois oferecerem a salvação na forma de um novo presidente não tão brilhante nem mesmo muito confiável, mas "menos ruim" e passível de ser engolido pelo eleitorado.

       Querem gerar , antes , a crença de que estamos à beira do abismo para oferecer depois a saída do abismo. Na verdade, estão inventando uma crise muito maior do que qualquer possível crise real.

       "Não vai ter Copa", "Caos Aéreo", "Fuga de turistas", "Desemprego", "Caos Econômico", "Incompetência da presidente",  "Tropeções na forma de discursar", "Inflação galopante", "Apagão da Diplomacia" -- são estes  slogans e  estas manchetes que procuram inventar. Quase todas desmentidas pelos fatos, fica claro que repousam apenas nos desejos de seus autores.

       Como a era Lula e Dilma produziu pautas muito positivas junto aos trabalhadores e ao povo pobre, agora querem passar a idéia terrorista de uma crise inexorável que vai corroer os salários, a estabilidade , deixar todos na rua e minar a estabilidade econômica..

      Como admitiu a presidente em entrevista recente, mesmo que existam problemas e que os rumos do crescimento precisem ser controlados e até corrigidos, o que a campanha publicitária terrorista procura fazer é exatamente abalar a crença de um futuro melhor e empurrar a opinião pública por meio do medo. Com isso, espera gerar o desejo de mudança e a crença  de que a oposição neoliberal no poder seria a única saída.

     A última novidade é a distribuição na entrada e saída em massa no metrô, pelo menos no de São Paulo, de milhares de adesivos onde está escrito: "Fora Dilma!" É por onde passam milhares de pessoas que trabalham, justamente os eleitores de Lula e de Dilma.

    É o que chamamos de campanha negativa. Baseada no ódio, na sugestão de frustração e, em conseqüência, no desejo de derrubar o governo. Não se trata de iniciativa dos garotos tresloucados do Rio nem do Movimento Passe Livre, que não deveriam ser presos, pois são apenas "massa de manobra" de forças mais poderosas. Essas ações não constituem gestos espontâneos de protesto democrático, como as vaias da classe média ressentida ou o início do movimento de junho de 2013. Nada disso. São iniciativas políticas e publicitárias com direção certa, destinadas a insuflar o desgosto, o medo e uma  raiva programada.

      Repetidas mil vezes pelo bombardeio da mídia conservadora e os comitês de campanha oposicionistas, essas ações podem gerar um desejo de mudança artificial, pelo menos até que a militância a favor das reformas políticas e sociais propostas pela presidente, a primeira mulher a governar o País , possa começar, enfim, a campanha "Fica, Dilma!"

      

 

quinta-feira, 17 de julho de 2014

O DEBATE FURADO


 

 

                                                                     Reinaldo Lobo*

 

     Passada a Copa, começa outro torneio. A briga entre os neoliberais "versus" o Estado. É o pretenso FlaXFlu dos que se apresentam como defensores da "livre iniciativa" contra o monstruoso Leviatã. Esse é o maior falso problema que domina o debate eleitoral brasileiro desde pelo menos a era FHC, iniciada em 1994 e encerrada em 2002.

    Um exemplo ridículo desse debate absurdo ocorreu agora, no fim dos jogos do Mundial, após a derrota acachapante do Brasil por 7x1 para a Alemanha. A presidente Dilma juntou-se aos clamores dos torcedores e dos cronistas esportivos, declarando que seria preciso reorganizar a estrutura do futebol brasileiro.  Pronto, foi o suficiente para que um dos candidatos da oposição, o neoliberal Aécio Neves, caísse matando. Acusou-a de "estatista", pois ela pretenderia criar a "Futebrás". Atribui-lhe intenções para justificar sua própria pregação ideológica. E também por razões eleitorais, claro.  Não adiantou a presidente explicar que não quis dizer isso e nem falava de estatização da CBF, mas de uma simples sugestão, que poderia ter força em se tratando de uma opinião presidencial. Ficou a "acusação" um tanto patética.

    Esse tipo de obsessão anti-estatal já havia começado nos tempos da ditadura civil-militar brasileira sob o nome de "desburocratização". A expressão era uma disfarce de políticos do regime e de empresários "liberais" para clamar contra o "excesso de Estado" na área econômica, ainda que nem sempre preferissem sua diminuição na esfera política e institucional. Estavam interessados, como o general Pinochet no Chile, no liberalismo econômico, jamais no político. E em não pagar impostos.

    Na fase terminal do autoritarismo brasileiro, com a crise inflacionária e a estagnação da economia, quase todo empresário se tornou democrata desde criancinha. Passou-se a equacionar liberdade política com diminuição do peso do Estado. Começou-se, então, a falar do "custo Brasil", a protestar contra a carga tributária e a repetir outros clichês dos porta-vozes "do mercado". Não era suficiente argumentar que o empresariado brasileiro sucumbiria a crises sistêmicas e conjunturais sem o Estado e as intervenções keynesianas na esfera da regulação geral, da geração de capital e mesmo da produtividade.Esses argumentos eram imediatamente descartados e taxados de "marxismo" e "populismo".

     Houve um presidente da FIESP , ainda no final da Ditadura, que foi um dos principais repetidores ideológicos do combate ao Estado. Suas empresas prosperaram muito nesse período vendendo aço e implementos siderúrgicos para obras estatais do "Brasil Grande".Os recursos para seus investimentos vieram dos empréstimos subsidiados pelo Tesouro Nacional. Não só no seu caso, a expressão "mamar nas tetas do governo"  é até fraca para descrever a verdadeira promiscuidade entre empresas privadas e o Estado.

     Os neoliberais negam que temos entre nós, na verdade, um Estado privatizado e abusado pelos conglomerados industriais,  agropecuários, fundos de pensão, grandes bancos e corporações. Um estranho animal, parecido com o Ornitorrinco, como costuma dizer o sociólogo Chico de Oliveira.

      Ao final do regime ditatorial, os defensores de um papel para o Estado no desenvolvimento calaram-se por um bom tempo, receosos de serem confundidos com antidemocratas. Esse período vai até 1989, quando houve a primeira eleição presidencial democrática e ainda prevalecia uma certa unidade de propósitos no sentido de recompor a sociedade e o Estado, restaurando as liberdades civis.

     A luta eleitoral abriu a temporada de caça ao Estado, com Collor representando, então, as forças do "novo liberalismo". Seguiram-se brigas ideológicas agudas, quando cada uma das correntes políticas, que alegavam combater unidas o autoritarismo, já estava no seu  próprio galho.

     Nessa época,  foram criadas as condições internas para, além do advento do curto período Collor, a chegada posterior de FHC. O discurso "moderno" do ex-governador de Alagoas foi buscar suas justificativas para chegar ao poder  no velho tema da "desburocratização" e dos privilégios do funcionalismo. O ex-embaixador brasileiro nos EUA, Roberto Campos, também chamado de "Bob Fields" por sua paixão americanófila, ficou empolgado com a conversa de Collor sobre os "marajás" instalados na burocracia estatal. Escreveu: "O jovem político encontrou o "inimigo objetivo" a fim de combater o distributivismo". Quer dizer, o perigo não era o "marajá" usado como retórica eleitoral, mas uma possível distribuição de renda pela via do Estado.

      Se examinarmos o conflito por uma perspectiva histórica, fica claro que o auge do sucesso da palavra "desestatizar" veio com um movimento externo combinado com essas condições internas, resultando nos oito anos de FHC. Houve no mundo a "revolução" ultra-neoliberal de Margareth Thatcher e de Ronald Reagan na Inglaterra e EUA, continuada pelo risonho inglês Tony Blair, e pelos norte-americanos Bush (pai) e Bill Clinton.

      Foram mais de duas décadas de "pensamento único" no planeta.Cerca de 160 países aplicaram a fórmula neoliberal da "escola de Chicago" sobre a primazia da "mão invisível do mercado". Começou com o Chile do "grande liberal" Pinochet, espalhou-se por toda parte e, na América Latina, incluiu os governos de Menem na Argentina e FHC no Brasil.

     O Estado virou o demônio a ser exorcizado após a queda do regime do "socialismo real" da URSS. Tudo "justificava" o horror a qualquer intervenção do Estado. O ciclo de crise capitalista que vinha desde 1974 com a questão do petróleo e a escassez de energia, achou um vilão-- o Estado do Bem Estar Social. Qualquer forma de proteção aos trabalhadores e de segurança social virou "privilégio" e "prejuízo".

    A ordem era elogiar o empreendedorismo possessivo e individualista. Todos conhecem essa história, que culminou nas crises de  2002,2005 e 2008, cujos efeitos ainda sofremos. O capitalismo "cassino" e "globalizado" criou um caos na esfera internacional. O desemprego europeu e norte-americano, a  quebradeira geral e a retração atingiram ,sobretudo,  aqueles países que mais levaram a sério o programa neoliberal. Sob FHC, já se tornou um dado registrado na História que o País quebrou três vezes, sendo salvo pelo FMI e pelos aliados como Clinton. Teve ainda um desemprego crescente.

       Um paradoxo da posição dos neoliberais é que, mesmo favoráveis ao individualismo econômico, conduziram o seu programa por meio de um poder de Estado centralizado. Os casos de Thatcher e Pinochet são óbvios. Isso pode ser detectado inclusive no governo FHC, cujo presidencialismo de medidas provisórias e de conchavos oligárquicos promoveu, sim , privatizações, só que à custa de ignorar a sociedade civil. Nossos neoliberais negam a realidade em três pontos importantes: 1.a atual crise do capitalismo foi provocada pela própria política deles; 2. a rede de proteção aos trabalhadores no Estado do Bem Estar na Europa foi, até agora, o que reduziu o impacto da crise; 3. a saída dessa situação atual não pode ser por meio do mesmo modelo que a produziu, mas por programas alternativos.

     Dizem também que devemos almejar o mínimo de governo possível a fim de facilitar a livre concorrência e ,assim, liberar a economia. Esse é o maior mito de todos.  O "laissez faire" que visam é imaginário.  Como falar de uma liberdade de mercado e de concorrência numa economia cada vez mais monopolizada e cartelizada? O que a ideologia neoliberal esconde é a sua verdade mais íntima: não é pela livre concorrência "pura", mas pela concentração cada vez maior da propriedade e da renda nas mãos de uma minoria.

 

* Reinaldo Lobo é psicanalista e articulista. Tem um blog: www.imaginarioradical.blogspot. com.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

"Ser radical é tomar as coisas pela raiz e, para o homem, a raiz é o próprio homem".

Karl Marx
( "Manuscritos Econômicos e Filosóficos")

quarta-feira, 2 de julho de 2014

O PAPA DIFERENTE


                                                                             Reinaldo Lobo        

    Quando o cardeal Ângelo Roncalli foi eleito acidentalmente, em 1958, e se tornou o Papa João XXIII, o "Papa Bom", uma camareira de Roma fez algumas perguntas para a filósofa Hannah Arendt, que lá estava:  "Senhora, esse papa era um verdadeiro cristão. Como podia ser isso? E como aconteceu que um verdadeiro cristão se sentasse no trono de São Pedro? Ele primeiro não teve de ser indicado bispo, e arcebispo, e cardeal, até finalmente ser eleito como papa? Ninguém tinha consciência de quem ele era?"

    Bem , a resposta à última das três  perguntas da reflexiva camareira parece ser "Não"-- disse Arendt. Ninguém entre os cardeais do conclave tinha consciência clara de quem era Ângelo Roncalli, até porque ele foi escolhido para ser um "papa provisório e transitório". Foi eleito por não haver consenso a respeito dos verdadeiros "papabile" iniciais.

   João XXIII foi uma completa  surpresa durante seu breve pontificado, de 58 até 63, quando realizou a mais profunda reforma interna e doutrinária da Igreja em muitos séculos, tornando-a mais popular e, ao mesmo tempo, um pouco mais moderna. O catolicismo expandiu-se numérica e qualitativamente como nunca sob esse papa verdadeiramente  cristão.

      A eleição do Papa Francisco teve algumas diferenças de contexto histórico e os cardeais sabiam quem ele era e de onde vinha. Foram buscar um papa do "fim-do-mundo" -- do Terceiro Mundo--, como ele mesmo assinalou ao passar de arcebispo Mario Jorge Bergoglio a 266° pontífice da Igreja Católica, primeiro nascido em continente americano, primeiro não-europeu em mais de 1200 anos e o primeiro papa jesuíta.

    A profunda crise atual por que passa a Igreja, que vai de escândalos financeiros no Banco do Vaticano até os casos notórios de pedofilia em várias paróquias do mundo todo, passando pela ascensão das rivais denominações pentecostais, levou o colégio de cardeais a correr um risco calculado de oferecer o nome de alguém bem diferente do antecessor que renunciou, Bento XVI, o sisudo e dogmático cardeal alemão Joseph Aloisius Ratzinger.

    Em quê o Papa Francisco é diferente? Por que a burocracia da Igreja correu um risco ao escolhê-lo? As respostas não são fáceis, mas estão evidentes hoje para todos as diferenças, a começar pela escolha do seu nome, inspirada na frase que lhe disse seu amigo brasileiro, o cardeal d. Claudio Hummes, ao cumprimentá-lo pela eleição : "Não se esqueça dos pobres". Ele não tem esquecido e o estilo de vida mais franciscano que adotou revela sua disposição de colocar a Igreja menos ao lado dos ricos e potentados, como esteve por séculos. Depois do interregno ultra-conservador dos papas João Paulo II e Bento XVI,  esse jesuíta simpático e amante do futebol é uma lufada de ar fresco.

      As instituições e suas burocracias tendem a escolher como seus representantes e líderes os mais fiéis aos seus interesses e valores administrativos. Muitas vezes, os premiados são os mais submissos às regras políticas da instituição e os mais medíocres. Quase todas as instituições e organizações conhecidas funcionam assim. Daí, a surpresa da camareira romana e da filósofa Hannah Arendt diante da escolha de um "verdadeiro cristão", que poderia levar a Igreja a resgatar princípios originais da instituição e,portanto, a revolucioná-la.

     Essa é outra característica de um "grupo de dependência" como a Igreja, isto é, um grupo que elege um Messias, uma doutrina e a disposição fideísta para seguir um mestre e seus dogmas. Quando cresce e se distancia do Mestre original, esquece suas origens e se prende a rituais e regras rotineiras para manter-se sólida. O resgate e a evocação da origem costumam ser subversivos. Daí a surpresa diante da evocação de Francisco de Assis, que contrasta muito com o luxo do trono ocupado por Bento XVI, mais a tolerância da burocracia católica com o novo Papa e com a mudança de rumos que pode imprimir em seu pontificado.

     A resistência à sua presença por parte dos conservadores do mundo todo assemelha-se muito à que sofreu João XXIII, acusado pela direita de  "bonzinho com o comunismo" e até mesmo de "marxista". Agora , a revista conservadora "The Economist" acusou-o de "seguir Lênin", o líder soviético que escreveu o livro "Imperialismo, etapa superior do capitalismo", em que assinala a tendência monopolista e concentradora de renda do capitalismo moderno. O Papa apontou a concentração de renda capitalista e os monopólios, e os criticou por aumentarem a desigualdade e a pobreza,  o que tem sido apontado até mesmo por economistas insuspeitos de "marxismo", como o norte-americano Paul Krugman  e o francês Thomas Piketty. Somente o que chamo de  a "burrice conservadora" ou a ma fé poderiam levar à conclusão de que ele seria "leninista".

     Sua frase sobre a existência de cristãos gays , dizendo "quem sou eu para condenar um homossexual que procura espiritualmente Cristo?", tocou em outro tema polêmico em que tem sido fustigado pela estupidez conservadora. Sua atitude, porém, começa a se difundir pela corpo da própria Igreja e vários católicos relatam nas redes sociais que já presenciaram padres falando em defesa das uniões homoafetivas do púlpito em suas missas.

     Ao mesmo tempo, o Papa acaba de excomungar os membros da Máfia, responsáveis pelo assassinato de uma criança de três anos na Sicília, e também expulsou das funções eclesiásticas o ex-núncio da República Dominicana, o polonês Jozef Wesolowski, condenado por pedofilia comprovada naquele país. As suas atitudes firmes fazem crer que o Papa continuará a condenar o crime, sobretudo quando cometido pelo próprios membros da Igreja, mas não ditará regras sobre as condutas humanas em geral. Sob seu pontificado, espera-se que a Igreja interfira menos na vida privada das pessoas e seja mais tolerante em seus juízos morais.

     No início, o Papa Francisco era um enigma. Existiam até acusações apócrifas de que teria sido leniente com a Ditadura Militar argentina quando era bispo. Depois descobriu-se que foram feitas até montagens fotográficas maldosas, dele ao lado do ex-ditador Jorge Videla, de quem "seria o confessor". Nada disso se comprovou. Sabe-se apenas que ele negociou a preservação dos Direitos Humanos naquele país, o que o fazia dialogar com freqüência com os ditadores dos anos 70 e inicio dos 80.

      Francisco vem humanizando o papado e é possível esperar que promova um gradual "aggiornamento" dos cânones da Igreja, como fez João XXIII. Tudo para evitar a decadência da instituição. É uma política mais  inteligente,  para dizer o mínimo, do que a do intelectual sofisticado Bento XVI.

    Se assim for, não é  preciso ser católico e nem mesmo acreditar piamente, para dizermos como os cristãos: "Deus o proteja". Vai precisar.