Reinaldo Lobo
Passei sem querer na frente
de um espelho e vi um velho com medo de pegar Covid.
No início, assustei-me,
depois olhei para ele com certa ternura. Inspirou-me cuidados e senti carinho.
Pedia indulgência.
Lembrei-me do meu pai na
velhice, andando com cautela, mas com um olhar de pressa em fazer o que ainda
não fizera, de pedir o perdão que faltou, de publicar o livro que não foi
escrito.
Recordei-me de um texto do
psicanalista inglês Elliott Jacques sobre a velhice obrigada a elaborar
novamente a posição depressiva diante da ambivalência entre vida e morte, amor
à vida e ódio inconformado, a fim de lidar com a maior perda de todas.
Como gosto de livros e
autores, veio-me também à lembrança o bruxo de Cosme Velho, dedicando
ironicamente as “Memórias Póstumas de Brás Cubas” ao primeiro verme a roer “meu
cadáver”.
Surgiu igualmente na memória
Erik Erikson, o psicanalista que escreveu sobre a “escolha final” entre
generatividade (deixar algo para as futuras gerações) versus desespero.
Ou Winnicott e o seu último
desejo pedido a Deus: “fazei com que eu esteja vivo na hora da minha morte”.
Então, depois da inevitável
tristeza e da comiseração, veio a esperança.
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