terça-feira, 2 de julho de 2013

UMA OUTRA ESQUERDA

Existe uma esquerda que não é marxista. Nem antimarxista -- entenda-se com clareza. É ,antes, pós-marxista. Ela considera urgente desmontar o aparato capitalista que submete a vida ao processo de produção e faz girar a condição humana em torno dos objetivos exclusivos de crescimento econômico ilimitado e do consumo irrefreável. Tem, portanto, em comum com a corrente marxista clássica o anti-capitalismo e o repúdio à sujeição dos povos às iniquidades, desigualdades, desperdício e destruição engendradas pela lógica e tecnológica do Capital. Essa nova esquerda, contudo, não considera como alternativa válida ao capitalismo o retorno ao regime de classes do totalitarismo chamado de "socialismo real" e de suas variantes. Esse termo foi cunhado pelo ex-secretário geral do PC soviético, Leonid Brejnev, para designar o sistema burocrático de exploração e de privilégios, falsamente espartano, que havia no Leste Europeu e em outros pontos, como China, Coréia do Norte e Cuba. Esse sistema sobreviveu, mais ou menos incólume, em meio a crises sucessivas do seu capitalismo de Estado até 1989, quando começou a ruir. Muitos disseram : ruiu como um castelo de cartas. Brejnev, que governou no período mais próspero da então URSS, na década de 70 até o início dos 80,usou essa expressão para identificar e justificar ideologicamente o seu regime, invocando uma espécie de "realismo" político do tipo medíocre. Seu raciocínio era mais ou menos assim: isso é o possível, é o que temos, o resto é utopia. Os marxistas mais sofisticados repudiam esse tipo de raciocínio, bem o sabemos. Apontam nele um determinismo pobre, mecânico e típico do stalinismo. Eles têm razão quanto à pobreza e mediocridade da justificação ideológica, mas ficam nisso. Não vão muito além, quando não se omitem, fazem de conta que não existiu o "socialismo real", com sua tirania de campos de concentração, seu universo concentracionário e sua perseguição às artes e à cultura. No máximo fazem como os herdeiros da Escola de Frankfurt, que assinalam a existência de um problema à esquerda, mas contrapõem ao "socialismo real" uma espécie de crítica cultural e filosófica, fundada no elogio da "negatividade pura" saída dos textos de Hegel. É um pouco aquilo que o próprio Marx apontou no "hegelianismo de esquerda" de sua juventude: a crítica da crítica crítica....E só. Esta é uma espécie de crítica "espiritual" do capitalismo, consistente num uso da razão, situando-a sempre à esquerda daquilo que está na realidade social. Omite um componente essencial da política, que não é só a "arte do possível" nem uma crítica filosófica. A política, a verdadeira política, contém um elemento de criatividade e de invenção apontado por autores tão diversos entre sí como Cornelius Castoriadis, Hannah Arendt, Claude Lefort e mesmo Edgar Morin, ao seu modo. Eles falam de uma política criativa que não é utópica, mas constitutiva de novas determinações. Criadora, portanto, de novas realidades. (Continuaremos a falar desta tendência no próximo post)

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